sexta-feira, 17 de julho de 2009

Paternidade presumida

O Senado aprovou, na última quarta-feira (15), projeto de lei que estabelece a presunção de paternidade por recusa do suposto pai em realizar o exame de DNA. Apresentado em 2001 pelo Deputado Federal Alberto Fraga, o aludido projeto só foi recebido seis anos depois na casa revisora. Aguarda-se somente a sanção presidencial da nova legislação.
Vejamos, pois, algumas anotações sobre a temática...
1) A filiação sob o prisma constitucional
A filiação, vínculo existente entre pais e filhos, pode ser de cunho biológico ou social. Na primeira categoria inserem-se aquelas provenientes de concepção (relação sexual, fertilização etc.), enquanto na segunda encontram-se as provenientes de adoção.
Nesse giro, veda-se - expressamente - no texto constitucional (art. 227, § 6º) qualquer discriminação entre filhos biológicos e adotivos, assegurando-se a eles igualdade de direitos perante seus genitores. O mesmo dispositivo garante paridade de tratamento para aqueles descendentes havidos fora da constância do casamento, ou seja, frutos de uma puladinha de cerca.
2) O reconhecimento de paternidade pelo Código Civil
O atual codice civile traz capítulo próprio sobre o tema em voga. Arrola-se lá duas hipóteses para tal ato, a saber: (i) reconhecimento voluntário; e (ii) reconhecimento não-voluntário (judicial). Ademais, conforme dicção do art. 1.607 do diploma legal em tela, pode dar-se tal reconhecimento pelos pais de modo conjunto ou separado.
O descendente advindo de relação adulterina ("a matre" ou "a patre", tanto faz) goza, portanto, da faculdade de acionar judicialmente seu suposto genitor para que se declare o vínculo biológico existente entre eles. Frise-se que tal ação de prova compete unicamente ao suposto filho (ação pessoal), sendo tal remédio jurídico imprescritível, cabendo aos herdeiros do vindicante manejar tal actio após sua morte.
3) A investigação de paternidade
Coube à Lei n. 8.560/92 regular - de modo superficial - a investigação de paternidade. Diz-se lá que tal ato é irrevogável, ou seja, uma vez realizado o reconhecimeto (voluntário, inclusive), não mais cabe arguir em sentido contrário.
Tal lei dispõe que todo registro de nascimento onde conste apenas a filiação materna deverá ser levado ao conhecimento do juiz competente. Munido desta e de outras informações é que se nomeia o suposto pai da criança, não importando se for casado.
Todavia, após a citação do mais novo papai, ou reconhece a paternidade ou nega ele veementemente tal vínculo de filiação. É o segundo caso que nos interessa!
Superada a "averiguação oficiosa" e havendo "elementos suficientes" para a suspeita, enviam aos autos ao Ministério Público. Está prestes a iniciar, pois, a Ação Investigatória de Paternidade.
É nesse procedimento judicial (mais especificamente na instrução probatória) que se procede o temido "exame de DNA".
4) A recusa e a presunção
Finalmente chegamos ao ponto mais intrigante da discussão. O imbróglio resume-se no embate entre o axioma jurídico do direito de não produzir provas contra si mesmo e o direito de (ter uma) paternidade. Questiona-se, portanto, se o suposto papai pode ter atribuída a si a paternidade de outrem pelo simples fato de recusar-se a fornecer elementos (sangue, raiz capilar etc.) para o exame. O projeto de lei aprovado anteontem pelo Senado prevê que sim.
Em verdade, parece-me razoável tal disposição. Há razão plausível para que suposto pai negue-se a fazer tal verificação em juízo? Restaria violada a sua intimidade? A sua constância matrimonial? Creio que não. No máximo atingiria-se a sua incolumidade física em razão da agulhadinha.
Mas um aspecto merece ponderação, o das mães que valem-se de tal expedimente de forma indevida, quase sempre em detrimento desse ou daquele homem. O projeto de lei silenciou-se quanto a isso, não abarcando penas para tal ato, o que foi observado pelo Senador Cristóvão Buarque.
5) Conclusão
Mostra-se acertada a previsão legal, coadunando com todos os ditames da CFRB/88. Garante-se o direito de ter um pai (e uma mãe), bem como os meios para que tal status seja resguardado. Utilizando-se de tal mecanismo com prudência (razoabilidade sempre!) e atentando para os indícios fáticos, mister que prospere tal disposição.

2 comentários:

Thiago de Melo disse...

Questão tormentosa será a do uso indevido do teste, como você mesmo bem acentuou Luiz.

Compelir e obrigar um cidadão a promover o teste de paternidade, de forma indevida - sem fundado receio - e reiterada, é atitude a ser coibida pelo Judiciário.

Já ouvi casos reais nos quais a mulher pediu mais de 5 vezes o teste de paternidade...

Luiz Riva disse...

Justo, nobre colega.
Pecou a lei por quedar-se silente quanto a isso.
Cabe, a me ver, uma condenação por litigância de má-fé ou ato atentatório contra a dignidade da justiça, de modo a não deixar impune quem faz uso de tal instrumento com ardil.